terça-feira, 4 de junho de 2013

(Prosa) Da moral,

por José Mauricio.

          Havia uma cidade chamada Aparência e nela uma fábrica chamada Moral, onde trabalhavam todos os habitantes de Aparência, que recebiam o adjetivo gentílico de Todos.
  Todos tinham seus empregos e recebiam no dia cinco de cada mês os seus salários. Em Aparência, o pagamento era feito com a moeda regional denominada Pudor.
  O governo de Aparência sustentava Todos com uma ajuda de impostos sobre alimentos, pois o Pudor era uma moeda muito desvalorizada fora da cidade; manter a Todos bem alimentados era um trabalho árduo.
Com algumas pesquisas no exterior e nos próprios laboratórios de Aparência, foi criado um suplemento alimentar chamado "Ousadia", que cessou com a ajuda de custos provida pelo governo de Aparência.
Assim: na Moral, Todos trabalham por Pudor e vivem de Aparência se falta Ousadia.

(Crônica) Coisas que deixamos pra trás,

por José Mauricio.

Em frente ao mar... Com a sinestesia da brisa vinda do quebrar das ondas, com o furor de sorrisos agudos, ansiosos pelo movimento de vai e vem da água, coisa que sempre acontece, mas que muitos parecem não entender... Assim como tantas outras coisas que sempre acontecem e que nunca conseguimos entender ou superar...

Ele sorria e olhava para o horizonte, como quem vê algo intrigante e ao mesmo tempo muito satisfatório, quando disse: - Hoje podemos dizer que conseguimos...
Ela respondeu com um quê de quem não acreditava no que via, apesar de não ver nada, concretamente: - E se tudo não passar de um sonho?
Ele, com toda segurança no que dizia, como se as palavras formassem castelos em seu movimento labial, respondeu a ela: - Creio que meu subconsciente não poderia me dispor de todo esse prazer!
Ela: - Você e suas indagações...
Ele: - ...
Ela, fechou a cara como se fosse levantar da areia e arremessar uma pedra de 1 tonelada sobre ele, mas apenas proferiu as seguintes pedradas, ou palavras, ou o que a voz pode proferir: - E por fim... Tudo vai acabar mesmo, mais cedo ou mais tarde... Tudo sempre acaba!
Ele conseguiu segurar a pedra, antes que ela o esmagasse como uma formiga indefesa e a arremessou, citando o seguinte: - Por que você sempre vem com esses restolhos de má esperança? Nós nos amamos, estamos juntos, estamos bem e da forma que queríamos... E o melhor disso tudo é que eu perdi meu velho medo de perder!
Ela não se conteve e fez com que suas lágrimas passassem a ser parte daquela imensa concentração de água salgada a sua frente...
Ele: - Por que você está chorando?
Ela respondeu, misturando ondas sonoras, lágrimas e medo: - E se tudo não passar de um sonho?
Ele recostou o rosto dela sobre seu ombro e disse, mesmo sem dizer, que era a fortaleza dela e depois disse, dizendo: - Se for um sonho, prometo que quando acordar levo seu café da manhã na cama, com uma rosa bem bonita e a foto do nosso primeiro beijo.
Ela sorriu esplendorosamente, como uma criança, logo em seguida o abraçou “aconchegantemente”: - Seu bobo...
Ele: - Você entende agora?
Ela: - O que?
Ele: - Que eu te amo...
Ela: - Sim, mesmo com todo esse medo antiquado que tenho do futuro...
Os dois se calaram. Ele parecia tentar lembrar afirmações praticas para provar o que ela disse e com sucesso, pois logo em seguida ele sorriu. 
Ela também sorriu, olhou nos olhos dele e disse: - Sabe o que sinto quando choro e olho pros seus olhos?
Ele: - Diga... ?
Ela respondeu firmemente, como um juiz determinando uma sentença: - Segurança!
Ele ficou sem o que dizer...
Mas ela completou o não dizer dele com palavras que reafirmavam a tal segurança que ele a trazia na troca de olhares, enquanto o olhar dela estava molhado e maleável e o dele seco e sólido, como um dardo que alcança o alvo...
E ela disse: - Ao seu lado parece que posso voar, pois sei que se cair você vai estar lá embaixo pronto para me pegar e dizer que me ama.
E ele continuava sem meias ou inteiras palavras...
Ela: - Lembra daquela vez que eu te disse que iria a praia com a Júlia e a Bianca, que você disse: “Não vai, eu não vou poder ir”, e eu, teimosa que só, disse: ”Ah ow! Pára de querer ser sempre o Super-Homem e me tratar como sua ‘Louis Lane’. Sei me cuidar sozinha, sabia? Você não sabe de tudo? Deveria saber isso também.” 
Ele respondeu chorando, meio que confuso: - E você foi...
Ela: - É... E eu me afoguei, mas...?
Ela esperava ele terminar a frase... “Mas...?”... Mas na verdade ele não sabia o que era pra ser dito...
Ele continuava chorando, ainda mais confuso: - Mas...?
Ela: - Você estava lá! Como sempre esteve...


Ele olhou pro horizonte, mesclando em seu âmago, choro profundo, pavor e insegurança, por incrível que pareça... Aquele homem que era a rocha viva, firmado em si mesmo, se mostrou inseguro perante àquele momento.
Ele: - Mas eu não estava!
Ela, agora a dona de toda a segurança, respondeu: Eu sei...


Naquele momento, o distúrbio na cabeça dele era tão grande que não saberia responder nem o próprio nome... E se mostrava cada vez mais inseguro e confuso: - ???
Ela sorriu e disse: Eu disse que tinha esse medo, ...
Ele estava agoniado: - Medo de que???
Ela lembrou de alguma coisa, sorriu e disse: - Você sempre querendo ser meu super-homem...
Ele: - Fala logo, medo de que? O que está havendo? Por que tudo está ficando tão claro e embaçado? E você tem medo de que?
Ela: - De que tudo fosse apenas um sonho...
E ele sentiu uma facada em seu peito...

Ele acordou, sentiu falta de alguma coisa, olhou pela janela e notou que o mar estava bravo, como se as ondas estivessem indignadas... Logo em seguida ele se olhou no espelho e viu que era ele o indignado, mesmo não sabendo com o que... Ele avistou um porta-retrato em cima do criado-mudo, que tinha sido comprado de um senhorzinho na estrada, “Por que você insiste em comprar troços velhos?”, ele a perguntou e ela respondeu como fosse PHD no assunto: - Não é velho, é antigo... Velho é esse seu jeito de querer tudo do mais moderno. Ainda acredita nessa tecnologia que chamam de progresso? Compra logo o criado-mudo e vamos embora.
Ele ria tanto, a ponto de quase chorar... Ele nunca dizia para ela, mas sem ela na vida dele, faltaria o todo dele mesmo...

Ele avistou o porta-retrato e obteve de relance uma resposta para duas perguntas: o porquê da indignação que sentiu no peito depois de olhar para o mar e o porquê de estar sentindo falta de alguma coisa...

“No final, tudo era um sonho”, ele disse a si mesmo... E o corpo de quem ele levaria o café da manhã na cama, não havia sido encontrado...

E a resposta era: Ela...

(Prosa) Caro Watson,

por José Mauricio.

     Ninguém devolve carteira cara-a-cara, ninguém perdoa quem meche com a namorada, trem que sai não espera quem grita... E você taí parado, achando que ela vai te esperar. Vai sonhando, caro Watson, vai sonhando...
Algum dia alguém já fez isso na História da humanidade? Vai lá, procura na Bíblia. Ninguém espera ninguém. A galera quer ressuscitar, quer ter pão - e quanto mais pão melhor, não é?! -, o pessoal quer remédio, quer médico de graça, mas ninguém aqui quer amor. Desde quando amor mata a fome? Desde quando amor impediu alguém de morrer? Desde quando, menino? Desde quando?
Você tá pensando o que? Que as pessoas são solidárias? Tá achando que o pessoal vai te ajudar? Que vão ouvir seu caso e te dar conselhos? Quanto mais você se mostra deficiente e sofredor mais a galera te pisa, te chuta e te amassa com os casos deles. Quem precisa de conselho é quem tem que aconselhar, caro Watson.
Você é um menino jovem, eu tenho um bom tempo de vida. Já desvendei muitos casos e, na maioria das vezes, eles acontecem pelo mesmo motivo: ego. Aliás, na maioria não, em todas as vezes. É um caso sério, caro Watson. É realmente um caso sério. A gente não vê mais tempo para poder auxiliar as pessoas, não temos tempo nem para dar informações nas ruas das nossas cidades movimentadas, nossas lágrimas só servem pra salgar o feijão com arroz da mamãe.
É isso que nós somos, Watson... É isso que nós sempre seremos.

(Prosa) Cantos de contos por horas,

por José Mauricio.

Bailarina. (17:42)

É chato quando ela faz questão de escrever essas coisas que te machucam mas que você que inventou que é para você e que você já algum dia foi importante para ela só porque passou tanto tempo e continua sentindo a mesma coisa sem ter nenhum ponto final mas cheio de virgulas e pausas e caminhos trocados que só vão se cruzar se a gente pular da ponte se ela pular porque eu já fiz a questão de mergulhar e esperá-la na lama no brejo no rio. Quedê bailarina? Morreu de tuberculose.

Repertório. (18:37)

Agora também ela está fazendo questão de construir meu repertório de audição quero voar desse mundo já não aguento mais é muita pausa muitos desvios pontes sobre esses sentimentos que ela trata como mazela mas é mal é amor é malícia é mal é mal é bom é bom demais é ruim para mim e para o coração maroto que não gosta de Nestlê e quer chocolate meio amargo desse amargo que de ti jorra. Você sabe escrever um soneto heroico? Posso tentar te ensinar?

Independência e morte. (10:48)

Djavan - Um amor puro
Lulu Santos - O último romântico
Paralamas do sucesso - Lanterna dos afogados

Hoje eu escolhi meu repertório e faço questão de gritar já que hoje eu também escolhi não doer escolhi não viver também mas não dou a mínima para a vida já que não há vida sem mágica e a mágica acabou porque ela não quer mais dançar e nem me ensinar os seus truques de ilusionismo mas quem escolhe o que beber hoje sou eu e eu vou tomar veneno só veneno só isso sem mais sem dor sem morte é só para me manter desacordado e em coma o tempo suficiente de alguém perceber que o Belo também adormece que o Belo também ama e chora por esse amor que o Belo é belo por amar uma Bela que embeleza toda a vida que vai acabar pelo visto que vai restar cinza do que foi belo do Belo que só foi belo enquanto não foi inconveniente com a razão e com o que se achou como sorte ou dom. A água que tem sal ou o sal que tem a água? É muito gosto nessa boca tão insípida que só sabe cantar em nota dó.

(Prosa) Caminhos,

por José Mauricio.

4h da madrugada,
pensamentos em grandes medidas de decibéis
e uma escolha a tomar:
O que, ou, melhor dizendo, quem?

Ele pensava:
- Longos caminhos, tantas estradas...
Creio que meu coração tem mais vertentes que o rio Nilo
e inúmeros ventrículos a mais
que os dois de um ser
humano
comum,
por onde corre
não só
hemoglobina,
ou enzimas,
ou glóbulos brancos,
ou gordura trans,
– a qual tem elevado meu colesterol –
mas corria também amor,
afeto
e
desejo.

.   .   .

Continuou:
- Meu coração se excitava
cada vez que eu optava por um rumo a seguir,
mas sempre batia na mesma e velha tecla.
Sempre quebrava a cara na mais antiga barreira do destino,
 que por inconveniência e tamanha perfeição,
sempre dava certo.
Meu músculo do miocárdio não aceitava ser dissecado
 para que fosse achada a tal da
intimidade,
que casava corpos
e casa
até o dia de hoje.
Sentimento tão buscado fisicamente
– porém o mais abstrato –
pela ignorância dos de hoje.
Meu fidalgo bombeador de energia ao meu corpo
não queria ser flechado por cupido nenhum.
Dizia ele:
“Se amor fosse sofrimento
o nome não seria morte,
mas sim ressurreição.”
Ele sempre foi tão bobo

.  .  .


Ele dizia que morreria sozinho. 
“Filhos? Nem pensar, já basta eu de louco nesse mundo.” 

Ele tinha traumas... 

Alguns ele mesmo criou, 
junto aos contos de onde tais surgiram para justificar-se como solitário. 
Ele tinha grandes rancores... 
Mas ele mesmo dizia que: 
“Mágoas passadas não movem moinhos 
e águas presentes não munem corações 
da grande sabedoria e autoridade 
para decidir entre 
viver sozinho 
ou 
com alguém 
. . . 
Ou ainda: 
Viver sozinho, com alguém!“

.   .   .

Ele concluiu: 
- Já é sabido de minha parte
o que,
ou,
melhor dizendo,
quem?

Entenda a vida como quiser, 
Mas tome um caminho.

(Poesia) Cada suspiro meu,

por José Mauricio.

"Tá mais pra letra de música", diria Igor.

Parece que não é a primeira vez,
e não muito tempo depois
você acorda do outro lado,
se esforçando para manter a força do sorriso dos dois.


O conto de fadas dentro de sua cabeça
é o seu mais novo melhor amigo,
mas é garantido, seguramente,
que eu vou estar lá quando a história perder seu sentido.

Porque quando eu precisava de um lugar
para descansar meu coração,
você estava aqui para me ajudar desde o início,
e com cada suspiro meu
você será a única luz para minha visão.

Eu estou correndo para a linha de chegada
de uma vida que está bem longe do fim.
A paz de espírito que deixei para trás,
rezo para que você tenha em seu jardim.

Você está esperando o ponteiro dos minutos
em uma contagem regressiva que por dias vai durar,
mas eu estou aqui para te dizer
que não vai demorar muito o “eu estou aqui para ficar”.

Esperar por menos noites e sentir o cansaço.
Vou te esperar. Dar-te um nó, meu Ex-laço.

Mesmo antes de amanhecer, no escuro,
vou sentir sua graça e sua afeição
e com cada suspiro meu,
você será a única luz para minha visão.


Porque quando eu precisava de um lugar
para descansar meu coração,
você estava aqui para me ajudar desde o início,
e com cada suspiro meu,
você será a única luz para minha visão.

Poema inspirado na música Every Breath.

(Crônica) Beatriz,

por José Mauricio.

Minha inspiração divina
Meu sopro de vida
Canção matutina
Oração mais que finda

E subo eu ainda
A procura de beatriz
Que a mim é vinda
A mais bela atriz 

E também a mais fingida
Que é samba e ferida
No coração que eu refiz

E passados anos ainda é tida
Como queixosa partida
No meu peito aprendiz.

Poema de Igor Fernandes.

Suzano vivia cantando essas cançõezinhas de gente melosa: 
"minha inspiração divina, meu sopro de vida". 

Bendito Suzano, cara legal. Todo mundo gosta de Suzano, ou pelo menos do que Suzano finge ser. Fingimento, só isso. Suzano tem um passado obscuro, numa cidadezinha, como o passado de todo psicopata. Suzano adestrava porcos - quer coisa mais de psicopata que isso? Capoeirista nato, nasceu na Bahia na década de 30 e veio pro Rio com 13 anos, fugindo dos pais, porque, dizia ele, que eles tentavam sacrificá-lo, essas coisas de gente assídua no candomblé, gente que não falta um trabalho de "trago seu amor de volta".
O cara era um ótimo empregado: não chegava atrasado, entregava tudo certinho antes do prazo com todos os relatórios prontinhos, mas nunca sorria, mesmo depois do aumento de setenta por cento que recebeu em seu salário. Seu Rogério achava isso estranho, era um cara bom de papo, torcia pro Vitória, sabia tudo sobre futebol e bolsa de valores, mas tinha uma coisa estranha nele: as pessoas não conseguiam ficar sozinhas com ele durante muito tempo. Não era bafo, nem que ele fosse antipático, ou não tivesse assunto, era algo... Uma áurea, ou coisa do tipo. Sei lá se meu lado exotérico está meio aflorado hoje, mas é isso.
O cara, tal de Suzano, um dia foi levado à depor como suspeito de um crime hediondo de Campo Grande - RJ. A vítima foi encontrada em pedaços dentro de sua casa, estraçalhada com uma faca nada amolada deixada no local. Quem via a cena podia sentir, talvez, o que a própria vítima sentiu. Essas horas o estômago embrulha. Nos antebraços, um em cada canto da cozinha, se via as marcas das mãos do homicida e a força com a qual ele domou a vítima. As peças de roupa da vítima estavam todas cortadas, jogadas por toda a casa, mas o que mais assustou foi a calcinha rosa posta na cabeça da vítima, fincada num cabo de vassoura na área de serviço. A cabeça foi a única parte que o assassino deixou intacta, fora os 6 cortes que ele fez nas sobrancelhas, 3 em cada uma delas, e os hematomas que denotavam que a morte aconteceu, segundo os legistas, a não mais que 5 horas atrás.
Suzano era o suspeito mais escancarado, pois a perícia encontrou seu semên na cama da morta, que tinha nome de Marrie. Trabalhavam na mesma empresa, ela era sua secretária. Há uns tempos vinham tendo um caso, mas nunca tinham ficado sozinhos os dois, porque o Estevão, colega de trabalho dos dois, lá do departamento de Marketing, tinha um lance com a Beatriz, colega de Marrie, aí faziam parzinho de casais. Marrie chegou a comentar com Beatriz e Estevão que nas duas únicas vezes que eles foram ao cinema sozinhos, ela se sentiu muito mal, enjoada, viu coisas estranhas, vultos, disse que quase desmaiou. Beatriz riu e disse que Suzano devia ser um negro muito bom mesmo para causar tudo isso. Estevão ficou irritado, mas não deu muita atenção, afinal guardava um pouco para as outras 3 colegas de trabalho com quais ele tinha casos e também para Cristina, sua esposa.
Alguns fãs de Dr. House poderiam dizer que talvez Suzano liberasse alguma substância, que induzisse as pessoas que ficam perto dele por muito tempo há algum tipo de esquizofrenia. Não era algo que se mostrava em pessoas específicas, qualquer um que ficasse sozinho com ele por um determinado tempo começava a sentir estas coisas esquisitas. Desde pequeno era isso. Suzano até se tornou um pouco introvertido por conta desse detalhe. Não ria pra qualquer um, negava alguns apertos de mãos, alguns o chamavam de presunçoso, mas ele não ligava. Esse negócio de ser introvertido o ajudou um pouco com as mulheres. A maioria delas gosta de gente quieta, misteriosa. O problema é que Suzano era misterioso até demais nesse caso. Ninguém sabia onde ele morava. Ele nunca aceitou uma carona e não tinha carro. E com o salário que ele ganhava poderia comprar 7 carros do ano. As pessoas o viam pegar o metrô; ele soltava na estação da Pavuna e depois disso ia andando para casa, então talvez morasse na Pavuna.
A polícia desmentiu essa história de Suzano morar na Pavuna, pois, se fora ele o assassino, ele levaria 2 horas para chegar na Pavuna saindo de Campo Grande, e o segurança do condomínio o viu sair às 4:30; sem levar em conta também que a morte foi, estimadamente, às 5:10. Mas preferiram dizer que ele não morava na Pavuna, que o segurança talvez não tivesse acertado o relógio no horário de verão, ou que o relatório dos legistas tinha alguma grande margem de erro do que dizer que ele não era o assassino. Tinha um quê de que queriam incriminá-lo a qualquer custo no ar. Mas deixemos as autoridades fazerem o seu papel.
Beatriz ficou chocada com o assassinato. Seu Rogério ficou tão preocupado com Bia que lhe deu 1 semana em casa, mas só deve ter feito isso por conta das leis trabalhistas, por que do jeito que ele era sovina... Seu Rogério morava sozinho, viúvo de dona Elizabeth que morreu depois do terceiro infarte consecutivo em apenas um dia. Elizabeth não tinha hipertensão, mas comia mais sal do que o que há no mar morto inteiro. Gabava-se de beber bastante água e ser mais saudável que Seu Rogério por isso, mas bateu as botas de um dia pro outro em seus curtos, ou longos para Seu Rogério, 38 anos. Rogério parecia dar graças a Deus em suas lágrimas falsas durante o velório. Suzano foi ao velório e ficou observando o Seu Rogério chorar, pensou logo: "Que cara falso esse"; Suzano via de longe uma lágrima falsa. Reconhecia assim facilmente, talvez, porque viu as que sua mãe derramava enquanto seu pai lhe agredia vorazmente. Por sofreguidão e angústia pela morte de dona Elizabeth, muito amiga de sua mãe, Suzano ficou também uma semana sem trabalhar.
Eles tinham ido ao cinema naquela semana de folga de Suzano, me refiro a Suzano e Marrie. Viram um filme de terror, desses que as mulheres passam o filme inteiro abraçadas com seus homens protetores. Marrie se queixou de estar se sentindo mal e Suzano a levou para casa; isso foi numa quarta-feira. Na sexta-feira foram de novo. Suzano decidiu que veriam um filme de comédia para evitar, pensando ele que o filme fosse a causa, que Marrie passasse mal de novo. Marrie acatou. Mas como todos os inteligentes sabemos, não adiantou muito. Marrie se sentiu mal novamente, com vertigens, delirou um pouco falando umas línguas estranhas... Coisa de louco, só quem viu pode falar. Deixou o copo de 500 ml de coca-cola cair no chão e tudo, imagina! Na saída do cinema encontraram uma amiga de infância de Marrie, conversaram um pouco e Marrie começou a se sentir melhor. Suzano a levou para casa e deu um trato daqueles. Esse negão arretado!
As pessoas da empresa comentavam muito sobre os modos de Suzano. Eram, como dizer... Impecáveis! Os homens o invejavam pela paciência que tinha em ser cavalheiro a todo tempo. As mulheres o aclamavam. Já tinha recebido centenas de milhares de bilhetinhos maliciosos das mulheres de toda a empresa, inclusive das mais bem casadas. Se colecionasse os bilhetes teria mais do que o número de páginas dos livros da biblioteca nacional. Aliás, Beatriz gostava muito de tirar suas folgas lá na biblioteca. Acabava-se de ler. Quase morria de tanto o fazer. Overdose de literatura... Se existisse, ela estaria muito perto. Suzano, por sua vez, ia vez ou outra até lá para pegar, ou entregar algum livro. Na quarta-feira da semana da folga de Bia, Suzano foi e encontrou-se por acaso com ela. Ficaram durante horas lendo sobre filosofia, astronomia e pautas das mais variadas, depois saíram para tomar um sorvete, Bia que convidou.
Pobre Bia, sujou seu vestido branquinho com sorvete de chocolate. Imagine o pesar. Suzano foi ajudar a pobre e nesse clima todo de sorvete escorrendo rolou um beijo. Mas um beijo daqueles, que até o sorveteiro babou. Derreteu tudo em baixo de Bia, que convidou Suzano à sua humilde residência. Agora ela estava realmente decidida a se sujar de chocolate! Em pensar que Suzano a considerava um pouco racista... Mas sempre foi assim né!? Para fornicação não há coisa melhor que um pouco de melanina.
Pobre Suzano, mais um assassinato! Penso que nem se Deus fosse advogado de Suzano ele conseguiria se livrar dessa. Bia foi a próxima vítima do assassino. Seu apartamento estava lavado em sangue. A cena se repetia em alguns detalhes: antebraços jogados um em cada canto da cozinha, com as mesmas marcas de mãos que apertaram com força; a cabeça intacta, com os mesmos 6 cortes nas sobrancelhas, o que diferenciava é que não tinha uma calcinha em cima, mas um pano de chão de banheiro, aqueles com desenhos de pés, e a cabeça estava em dentro do vaso do banheiro, entupido e cheio de fezes.
Pobre Suzano! Mas para sua sorte não haviam provas suficientes para incriminá-lo, a não ser seu sêmen na cama das duas vítimas. Não haviam digitais, roupas do assassino, ou qualquer coisa do tipo. Ele usava sempre uma faca desamolada e matava da mesma forma: lutava com a vítima; fazia um rasgo no abdômen (sem seguir qualquer regra, o rasgo era apenas para matar a vítima);  enquanto a vítima agonizava, ele ia cortando membro a membro do corpo; depois os despeçava e jogava pelos cômodos. O que se repetia nesse aspecto eram os antebraços na cozinha e a cabeça sempre algum objeto em cima e com os cortes nas sobrancelhas.
Haviam rumores na empresa, um ar meio sombrio rondava o lugar, as pessoas passavam longe da sala de Suzano, sua nova secretária se demitiu, mas o mais estranho eram os 2 porta-retratos que Seu Rogério viu na sala de Suzano, um com uma foto de Marrie e outro com uma foto de Bia. Suzano viu o tal olhando para eles e disse, um pouco nervoso me parece:
- Eu coloquei ai depois dos assassinatos. Sinto falta daquelas duas. Elas fazem muita falta para a empresa, eram umas das poucas pessoas em que eu confiava de verdade.
Seu Rogério creu na verossimilidade que a fala de Suzano transmitiu e completou:
- É, Suzano, aquelas duas vão fazer muita falta. Ainda mais agora nesse período de bang! da Bolsa de Tóquio. - o velho apontou para os gráficos na parede - Têm nos aparecido muitos projetos e Beatriz era uma das consultoras que mais rendia nessa empresa, trabalhava muito e sempre com uma sublime excelência.
- Marrie também nunca deixou a desejar como minha secretária. - disse Suzano olhando a foto da moça.
Depois da morte de Beatriz, Estevão e Suzano ficaram mais próximos, apesar do antagonismo dos fatos. O caso era que Estevão não cria que Suzano fosse o assassino, pensou que fosse outro tipo de pessoa, que ele sabia bem quem podia ser. Suzano descobriu um segredo que Estevão guardava muito bem: ele era o gigolô da empresa. As mulheres pagavam para sair com ele e às vezes bem caro, inclusive as mais bem casadas. Suzano entendeu logo o porquê de tantos bilhetinhos maliciosos vindos especialmente desse grupo de pessoas: a maioria das mulheres casadas que trabalham doze horas em empresas de economia não devem ter tempo para manter uma vida sexual instável e satisfatória com o parceiro, logo procuram a água da fonte mais perto. E pelo tanto de mulheres diferentes e magníficas, colegas de trabalho, ou não, com as quais Suzano já viu Estevão sair, ele devia ser um ótimo gigolô.
A amizade dos dois crescia paulatinamente. Estevão até chegou a convidar o "negão" - como o chamava - para entrar no negócio com ele. Pediam conselhos um para o outro: Estevão sobre como ser mais cordial com as mulheres, Suzano como fugir de tantos olhares de repugnação como se ele tivesse mesmo matado as meninas. É claro que nunca conversavam sozinhos os dois por muito tempo. Suzano contou sobre essas coisas estranhas que tinha desde pequeno e explicou que era melhor para o amigo que não conversassem por mais de 4 horas seguidas sozinhos. Não era nem pela presença, era pelo fato da conversa. Talvez Suzano realmente tivesse um bafo-de-onça, mas ai a história não teria tanta graça.
Suzano foi à farmácia, estava com um pouco de tosse, esses sintomas de falta de umidade no ar. Comprou um xarope e aproveitou para comprar preservativos. Talvez ele quase tivesse que pedir por encomenda, era quase um tamanho único, o tamanho que a farmácia só comprava uma caixa que durava quase uns 5 anos para vender tudo... Big Mac Ultra Mega Giga Power Grande. Grande Suzano. A caixa da farmácia bateu o código do xarope, mas na hora do preservativo arregalou aqueles olhões maliciosos. Quem sabe imaginou que poderia ser atropelada por um ônibus alguma vez na vida, quem sabe imaginou que poderia ter um filho com Síndrome de Down, quem sabe o que ela imaginou... Uma loirinha com cara de sapeca, de grande caráter, ótimas medidas, quadril esmerilhado, lábios aveludados e todo o mais que "gente grande" tem direito.
Na nota fiscal veio não só o preço dos produtos que comprou, mas também o telefone da loira, o endereço da casa e uma frase que dizia: "te espero às 20h, gigante". Coisa de louco esse Suzano. Por um momento passou em sua cabeça cobrar pelo serviço, afinal, tempo é dinheiro, como dizem os economistas e os sovinas, como Seu Rogério. Suzano contou o caso para Estevão:
- Imagina só, a mulher olha para o tamanho do preservativo que eu uso e já me faz uma oferta libertina dessas. Como pode? Esse Brasil tá todo corrompido mesmo.
Estevão riu-se e retrucou: - Até parece que você não gostou, não é, Seu Suzano! Larga disso e vá na casa da menina. Vá se distrair, dê um pouco de prazer a ela. Você é um "grande homem" e um "grande amigo", escute o que eu digo.
Os dois caíram na gargalhada. Suzano disse:
- Vou ver o que posso fazer por ela. Vou pensar no caso.
- Deixa eu voltar para minha sala. - disse Estevão saindo da sala de Suzano - Ah, mas não se esqueça. - Estevão lembrou-se de alguma coisa - só não a mate depois.
- Tudo bem, vou ver o que faço. - disse Suzano.
Os dois riram novamente.
Durante o resto do dia de trabalho, Suzano recebeu alguns bilhetinhos anônimos com ditos bem pesados até para ele, que era velho de guerra no mundo da sacanagem em anonimato. Coisas que nem devem ser ditas aqui neste relato. Mas o que mais o intrigou foi o último bilhete que recebeu bem na hora que iria terminar seu expediente, logo depois de uma conversa que teve com Seu Rogério sobre um dinheiro que precisaria a mais para um projeto que tinha em mente. O bilhete dizia: 
"Dou-lhe tudo o que você quiser.
Dou-lhe meu corpo, minha vida.
Dou-lhe dinheiro. Dou-lhe minha fé.
Dou-lhe meus lábios e uma lambida."
Suzano seguiu caminho para sua residência, o mistério. Tomou banho e ficou pensando se iria ou não a casa da loira da farmácia. Foi! Mais uma morta... Pensamos todos! Mas não, dessa vez ele assumiu a morte, mas foi um suicídio. Morte por prazer não é morte, como diria Noel Rosa, ou não diria. A tal loira da farmácia tomou 3 viagras, por que queria aguentar tudo aquilo que ela esperava. Mas infelizmente não aguentou nem mais de uma hora de amor com Suzano. Teve um infarte e bateu as botas, as que nem usava no momento. Mas morrer de prazer não é morte, como alguém diria. A polícia até tentou acusar Suzano pela morte da indivídua, mas não podiam. Talvez tivessem que acusar a natureza, a maioria das coisas é realmente culpa dela, menina peralta cheia de suas artimanhas; se seu nome fosse Beatriz, viria bem a calhar.