terça-feira, 4 de junho de 2013

(Crônica) A vida, pelos cracudos,

por José Mauricio.

Da vida e suas etapas.
Há três tipos de gente: os que imaginam o que acontece, os que não sabem o que acontecem e nós, os que fazem acontecer. A vida? A vida não é nada mais que uma pedra no caminho. E as pedras no caminho a gente fuma. Traga. Engole. Invade. Prova e aprova. Sabe o que esse Brasil seria sem a nossa presença? Um poço de impurezas. Já pensou que nós somos o ponto de equilíbrio dessa osmose social? O governo tira do povo, o povo tira do governo. E nós? Nós tiramos de quem? Somos a própria independência. Temos por pai Dom Pedro I e por mãe a lua. A rua é nossa casa e somos a causa das angústias da humanidade. Viciados em nosso próprio corpo, templo do espirictus sanctus, que o padre sempre nos prega. O almoço na igreja está entrando em decadência, essa é a grande e única verdade que me libertou de alguma coisa.
Vocês podem pensar que não, mas todos vocês são uma parte de nós. Somos todos o vício, a penúria, a solidão. Somos o lixo, o prolixo, o prelúdio das cavalarias mecanizadas de nossa poluição visual, que fazem questão de não reproduzir nos postais. Imputaram-nos a voltar de onde viemos, ao ventre de nossas mães, ao anus de nossa madre, ao seio de nossa amada, à pobreza, ao vácuo  da insolidariedade popular nos dias de hoje. Só queremos uma roupa para vestirmos, um jornal para nos cobrirmos, uma guimba para fumarmos, um sinal para atravessarmos. Passarelas não servem para nada. É coisa de quem vive bem, é coisa de quem almeja algo. Nós almejamos o dia, o dia após o outro dia não coabitará em nossos desejos.
A calma de vocês me irrita.


Da vida dos escritores.
Acham que são melhores que nós. Os mais humildes e verdadeiros reconhecem que são como nós: fumam seus papéis, torram seus fonemas e tragam os códigos gramaticais. Tragam como se só houvesse isso para tragar. Tragam como se só houvesse isso para fazer na vida. Vivem como se só houvesse tempo para tragar. E tragam como se só houvesse tempo para viver este tempo de tragar.
É o tempo de colher e de escolher a dedo nossas personalidades. Nós escolhemos a nossa. A verdade. A liberdade. A pureza. Engolimos a seco esses grãos de areia branca e fina, esse pedaço de gordura de touros... Somos o requinte do proletariado. Os hippies sem paz, pois paz sem voz é medo e nos já emudecemos há muito. Cortaram nossas gargantas enquanto garganteávamos por nossa alforria. Desfiaram as cordas vocais, já finas e bambas nas quais a vida nos meteu.
Os escritores e seus afãs... Ah!, são todos fãs da fidelidade aos deuses pagãos, as deusas pagãs, ao paganismo que nos entretêm. Vinho alegra. Orgia purifica. E vamos à luta! Salve Jorge, Salve o Lula, Salve o Brasil. Se estourar a bolsa, eles nos darão outra: a Bolsa Família. Uma família inteira de gente que digere os projéteis esdrúxulos que vendem por unidade.
Os escritores são nossos maiores fãs. São parte da família. Fumam a vida, vivem o fumo e esfumaçam a manhã que nunca chega. O céu é cinza. Cinza-crack.


Da vida dos pombos.
Reações e mais reações. Em cadeia. Na cadeia. Prederam os ratos e puseram asas, nasceram então os pombos. Fedem o perfume dos ônibus cheios com a mesma aparência de quem os pega. Todos são pombos e todos os pombos se drogam. Injetam, cheiram, inalam, bebem, ouvem, se matam. Todos os tipos de drogas e todos os tipos de consumos. Tipifiquemos então quem são os pombos:
1 - Imagine a morte de um anão que foi rejeitado pela comunhão e pela catequese da vanguarda;
2 - Tente visualizar o enterro do anão, do pequenino, do polegar...
Impossível!

Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram sobre enterro de anões. Nem dos 7, nem dos 70, nem dos milhões. Anão não morre. Anão vira... Pombos coabitam entre si, não os leve por eunucos ou dos celibatários. Eles coabitam e muito. Quase como os leões, ou os coelhos, ou os grilos, ou os vagalumes. Mas são estéreis, os coitados. Pombo não tem filhote. Pombo não nasce. E anão não morre. Anão vira pombo.
Povoam e esvoaçam e sobrevoam o nosso dia-a-dia. O pombo - gavião cracudo - é o anão que cansou de ser chacota, que cansou de pintar os rodapés e de não alcançar os cabeçalhos ou o sucrilho em cima do armário.
Somos, nós, pombos sem asa. Batemos nossos braços, batemos nossas palmas, planejamos e plantamos a esperança, ou a amargura, e nos deliciamos com o medo alheio que todos sentem por nós. Somos tão sujos quanto os empregados da COMLURB, esses que ninguém tem a ousadia de sentar ao lado no coletivo.
A sociedade nos expulsa, refutam nossas almas e nos chamam de porcos e nos tacam pelos precipícios. Todos os demônios habitam em nós e eles são muito mais do que apenas 7... São uma legião.

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