terça-feira, 4 de junho de 2013

(Prosa) Da moral,

por José Mauricio.

          Havia uma cidade chamada Aparência e nela uma fábrica chamada Moral, onde trabalhavam todos os habitantes de Aparência, que recebiam o adjetivo gentílico de Todos.
  Todos tinham seus empregos e recebiam no dia cinco de cada mês os seus salários. Em Aparência, o pagamento era feito com a moeda regional denominada Pudor.
  O governo de Aparência sustentava Todos com uma ajuda de impostos sobre alimentos, pois o Pudor era uma moeda muito desvalorizada fora da cidade; manter a Todos bem alimentados era um trabalho árduo.
Com algumas pesquisas no exterior e nos próprios laboratórios de Aparência, foi criado um suplemento alimentar chamado "Ousadia", que cessou com a ajuda de custos provida pelo governo de Aparência.
Assim: na Moral, Todos trabalham por Pudor e vivem de Aparência se falta Ousadia.

(Crônica) Coisas que deixamos pra trás,

por José Mauricio.

Em frente ao mar... Com a sinestesia da brisa vinda do quebrar das ondas, com o furor de sorrisos agudos, ansiosos pelo movimento de vai e vem da água, coisa que sempre acontece, mas que muitos parecem não entender... Assim como tantas outras coisas que sempre acontecem e que nunca conseguimos entender ou superar...

Ele sorria e olhava para o horizonte, como quem vê algo intrigante e ao mesmo tempo muito satisfatório, quando disse: - Hoje podemos dizer que conseguimos...
Ela respondeu com um quê de quem não acreditava no que via, apesar de não ver nada, concretamente: - E se tudo não passar de um sonho?
Ele, com toda segurança no que dizia, como se as palavras formassem castelos em seu movimento labial, respondeu a ela: - Creio que meu subconsciente não poderia me dispor de todo esse prazer!
Ela: - Você e suas indagações...
Ele: - ...
Ela, fechou a cara como se fosse levantar da areia e arremessar uma pedra de 1 tonelada sobre ele, mas apenas proferiu as seguintes pedradas, ou palavras, ou o que a voz pode proferir: - E por fim... Tudo vai acabar mesmo, mais cedo ou mais tarde... Tudo sempre acaba!
Ele conseguiu segurar a pedra, antes que ela o esmagasse como uma formiga indefesa e a arremessou, citando o seguinte: - Por que você sempre vem com esses restolhos de má esperança? Nós nos amamos, estamos juntos, estamos bem e da forma que queríamos... E o melhor disso tudo é que eu perdi meu velho medo de perder!
Ela não se conteve e fez com que suas lágrimas passassem a ser parte daquela imensa concentração de água salgada a sua frente...
Ele: - Por que você está chorando?
Ela respondeu, misturando ondas sonoras, lágrimas e medo: - E se tudo não passar de um sonho?
Ele recostou o rosto dela sobre seu ombro e disse, mesmo sem dizer, que era a fortaleza dela e depois disse, dizendo: - Se for um sonho, prometo que quando acordar levo seu café da manhã na cama, com uma rosa bem bonita e a foto do nosso primeiro beijo.
Ela sorriu esplendorosamente, como uma criança, logo em seguida o abraçou “aconchegantemente”: - Seu bobo...
Ele: - Você entende agora?
Ela: - O que?
Ele: - Que eu te amo...
Ela: - Sim, mesmo com todo esse medo antiquado que tenho do futuro...
Os dois se calaram. Ele parecia tentar lembrar afirmações praticas para provar o que ela disse e com sucesso, pois logo em seguida ele sorriu. 
Ela também sorriu, olhou nos olhos dele e disse: - Sabe o que sinto quando choro e olho pros seus olhos?
Ele: - Diga... ?
Ela respondeu firmemente, como um juiz determinando uma sentença: - Segurança!
Ele ficou sem o que dizer...
Mas ela completou o não dizer dele com palavras que reafirmavam a tal segurança que ele a trazia na troca de olhares, enquanto o olhar dela estava molhado e maleável e o dele seco e sólido, como um dardo que alcança o alvo...
E ela disse: - Ao seu lado parece que posso voar, pois sei que se cair você vai estar lá embaixo pronto para me pegar e dizer que me ama.
E ele continuava sem meias ou inteiras palavras...
Ela: - Lembra daquela vez que eu te disse que iria a praia com a Júlia e a Bianca, que você disse: “Não vai, eu não vou poder ir”, e eu, teimosa que só, disse: ”Ah ow! Pára de querer ser sempre o Super-Homem e me tratar como sua ‘Louis Lane’. Sei me cuidar sozinha, sabia? Você não sabe de tudo? Deveria saber isso também.” 
Ele respondeu chorando, meio que confuso: - E você foi...
Ela: - É... E eu me afoguei, mas...?
Ela esperava ele terminar a frase... “Mas...?”... Mas na verdade ele não sabia o que era pra ser dito...
Ele continuava chorando, ainda mais confuso: - Mas...?
Ela: - Você estava lá! Como sempre esteve...


Ele olhou pro horizonte, mesclando em seu âmago, choro profundo, pavor e insegurança, por incrível que pareça... Aquele homem que era a rocha viva, firmado em si mesmo, se mostrou inseguro perante àquele momento.
Ele: - Mas eu não estava!
Ela, agora a dona de toda a segurança, respondeu: Eu sei...


Naquele momento, o distúrbio na cabeça dele era tão grande que não saberia responder nem o próprio nome... E se mostrava cada vez mais inseguro e confuso: - ???
Ela sorriu e disse: Eu disse que tinha esse medo, ...
Ele estava agoniado: - Medo de que???
Ela lembrou de alguma coisa, sorriu e disse: - Você sempre querendo ser meu super-homem...
Ele: - Fala logo, medo de que? O que está havendo? Por que tudo está ficando tão claro e embaçado? E você tem medo de que?
Ela: - De que tudo fosse apenas um sonho...
E ele sentiu uma facada em seu peito...

Ele acordou, sentiu falta de alguma coisa, olhou pela janela e notou que o mar estava bravo, como se as ondas estivessem indignadas... Logo em seguida ele se olhou no espelho e viu que era ele o indignado, mesmo não sabendo com o que... Ele avistou um porta-retrato em cima do criado-mudo, que tinha sido comprado de um senhorzinho na estrada, “Por que você insiste em comprar troços velhos?”, ele a perguntou e ela respondeu como fosse PHD no assunto: - Não é velho, é antigo... Velho é esse seu jeito de querer tudo do mais moderno. Ainda acredita nessa tecnologia que chamam de progresso? Compra logo o criado-mudo e vamos embora.
Ele ria tanto, a ponto de quase chorar... Ele nunca dizia para ela, mas sem ela na vida dele, faltaria o todo dele mesmo...

Ele avistou o porta-retrato e obteve de relance uma resposta para duas perguntas: o porquê da indignação que sentiu no peito depois de olhar para o mar e o porquê de estar sentindo falta de alguma coisa...

“No final, tudo era um sonho”, ele disse a si mesmo... E o corpo de quem ele levaria o café da manhã na cama, não havia sido encontrado...

E a resposta era: Ela...

(Prosa) Caro Watson,

por José Mauricio.

     Ninguém devolve carteira cara-a-cara, ninguém perdoa quem meche com a namorada, trem que sai não espera quem grita... E você taí parado, achando que ela vai te esperar. Vai sonhando, caro Watson, vai sonhando...
Algum dia alguém já fez isso na História da humanidade? Vai lá, procura na Bíblia. Ninguém espera ninguém. A galera quer ressuscitar, quer ter pão - e quanto mais pão melhor, não é?! -, o pessoal quer remédio, quer médico de graça, mas ninguém aqui quer amor. Desde quando amor mata a fome? Desde quando amor impediu alguém de morrer? Desde quando, menino? Desde quando?
Você tá pensando o que? Que as pessoas são solidárias? Tá achando que o pessoal vai te ajudar? Que vão ouvir seu caso e te dar conselhos? Quanto mais você se mostra deficiente e sofredor mais a galera te pisa, te chuta e te amassa com os casos deles. Quem precisa de conselho é quem tem que aconselhar, caro Watson.
Você é um menino jovem, eu tenho um bom tempo de vida. Já desvendei muitos casos e, na maioria das vezes, eles acontecem pelo mesmo motivo: ego. Aliás, na maioria não, em todas as vezes. É um caso sério, caro Watson. É realmente um caso sério. A gente não vê mais tempo para poder auxiliar as pessoas, não temos tempo nem para dar informações nas ruas das nossas cidades movimentadas, nossas lágrimas só servem pra salgar o feijão com arroz da mamãe.
É isso que nós somos, Watson... É isso que nós sempre seremos.

(Prosa) Cantos de contos por horas,

por José Mauricio.

Bailarina. (17:42)

É chato quando ela faz questão de escrever essas coisas que te machucam mas que você que inventou que é para você e que você já algum dia foi importante para ela só porque passou tanto tempo e continua sentindo a mesma coisa sem ter nenhum ponto final mas cheio de virgulas e pausas e caminhos trocados que só vão se cruzar se a gente pular da ponte se ela pular porque eu já fiz a questão de mergulhar e esperá-la na lama no brejo no rio. Quedê bailarina? Morreu de tuberculose.

Repertório. (18:37)

Agora também ela está fazendo questão de construir meu repertório de audição quero voar desse mundo já não aguento mais é muita pausa muitos desvios pontes sobre esses sentimentos que ela trata como mazela mas é mal é amor é malícia é mal é mal é bom é bom demais é ruim para mim e para o coração maroto que não gosta de Nestlê e quer chocolate meio amargo desse amargo que de ti jorra. Você sabe escrever um soneto heroico? Posso tentar te ensinar?

Independência e morte. (10:48)

Djavan - Um amor puro
Lulu Santos - O último romântico
Paralamas do sucesso - Lanterna dos afogados

Hoje eu escolhi meu repertório e faço questão de gritar já que hoje eu também escolhi não doer escolhi não viver também mas não dou a mínima para a vida já que não há vida sem mágica e a mágica acabou porque ela não quer mais dançar e nem me ensinar os seus truques de ilusionismo mas quem escolhe o que beber hoje sou eu e eu vou tomar veneno só veneno só isso sem mais sem dor sem morte é só para me manter desacordado e em coma o tempo suficiente de alguém perceber que o Belo também adormece que o Belo também ama e chora por esse amor que o Belo é belo por amar uma Bela que embeleza toda a vida que vai acabar pelo visto que vai restar cinza do que foi belo do Belo que só foi belo enquanto não foi inconveniente com a razão e com o que se achou como sorte ou dom. A água que tem sal ou o sal que tem a água? É muito gosto nessa boca tão insípida que só sabe cantar em nota dó.

(Prosa) Caminhos,

por José Mauricio.

4h da madrugada,
pensamentos em grandes medidas de decibéis
e uma escolha a tomar:
O que, ou, melhor dizendo, quem?

Ele pensava:
- Longos caminhos, tantas estradas...
Creio que meu coração tem mais vertentes que o rio Nilo
e inúmeros ventrículos a mais
que os dois de um ser
humano
comum,
por onde corre
não só
hemoglobina,
ou enzimas,
ou glóbulos brancos,
ou gordura trans,
– a qual tem elevado meu colesterol –
mas corria também amor,
afeto
e
desejo.

.   .   .

Continuou:
- Meu coração se excitava
cada vez que eu optava por um rumo a seguir,
mas sempre batia na mesma e velha tecla.
Sempre quebrava a cara na mais antiga barreira do destino,
 que por inconveniência e tamanha perfeição,
sempre dava certo.
Meu músculo do miocárdio não aceitava ser dissecado
 para que fosse achada a tal da
intimidade,
que casava corpos
e casa
até o dia de hoje.
Sentimento tão buscado fisicamente
– porém o mais abstrato –
pela ignorância dos de hoje.
Meu fidalgo bombeador de energia ao meu corpo
não queria ser flechado por cupido nenhum.
Dizia ele:
“Se amor fosse sofrimento
o nome não seria morte,
mas sim ressurreição.”
Ele sempre foi tão bobo

.  .  .


Ele dizia que morreria sozinho. 
“Filhos? Nem pensar, já basta eu de louco nesse mundo.” 

Ele tinha traumas... 

Alguns ele mesmo criou, 
junto aos contos de onde tais surgiram para justificar-se como solitário. 
Ele tinha grandes rancores... 
Mas ele mesmo dizia que: 
“Mágoas passadas não movem moinhos 
e águas presentes não munem corações 
da grande sabedoria e autoridade 
para decidir entre 
viver sozinho 
ou 
com alguém 
. . . 
Ou ainda: 
Viver sozinho, com alguém!“

.   .   .

Ele concluiu: 
- Já é sabido de minha parte
o que,
ou,
melhor dizendo,
quem?

Entenda a vida como quiser, 
Mas tome um caminho.

(Poesia) Cada suspiro meu,

por José Mauricio.

"Tá mais pra letra de música", diria Igor.

Parece que não é a primeira vez,
e não muito tempo depois
você acorda do outro lado,
se esforçando para manter a força do sorriso dos dois.


O conto de fadas dentro de sua cabeça
é o seu mais novo melhor amigo,
mas é garantido, seguramente,
que eu vou estar lá quando a história perder seu sentido.

Porque quando eu precisava de um lugar
para descansar meu coração,
você estava aqui para me ajudar desde o início,
e com cada suspiro meu
você será a única luz para minha visão.

Eu estou correndo para a linha de chegada
de uma vida que está bem longe do fim.
A paz de espírito que deixei para trás,
rezo para que você tenha em seu jardim.

Você está esperando o ponteiro dos minutos
em uma contagem regressiva que por dias vai durar,
mas eu estou aqui para te dizer
que não vai demorar muito o “eu estou aqui para ficar”.

Esperar por menos noites e sentir o cansaço.
Vou te esperar. Dar-te um nó, meu Ex-laço.

Mesmo antes de amanhecer, no escuro,
vou sentir sua graça e sua afeição
e com cada suspiro meu,
você será a única luz para minha visão.


Porque quando eu precisava de um lugar
para descansar meu coração,
você estava aqui para me ajudar desde o início,
e com cada suspiro meu,
você será a única luz para minha visão.

Poema inspirado na música Every Breath.

(Crônica) Beatriz,

por José Mauricio.

Minha inspiração divina
Meu sopro de vida
Canção matutina
Oração mais que finda

E subo eu ainda
A procura de beatriz
Que a mim é vinda
A mais bela atriz 

E também a mais fingida
Que é samba e ferida
No coração que eu refiz

E passados anos ainda é tida
Como queixosa partida
No meu peito aprendiz.

Poema de Igor Fernandes.

Suzano vivia cantando essas cançõezinhas de gente melosa: 
"minha inspiração divina, meu sopro de vida". 

Bendito Suzano, cara legal. Todo mundo gosta de Suzano, ou pelo menos do que Suzano finge ser. Fingimento, só isso. Suzano tem um passado obscuro, numa cidadezinha, como o passado de todo psicopata. Suzano adestrava porcos - quer coisa mais de psicopata que isso? Capoeirista nato, nasceu na Bahia na década de 30 e veio pro Rio com 13 anos, fugindo dos pais, porque, dizia ele, que eles tentavam sacrificá-lo, essas coisas de gente assídua no candomblé, gente que não falta um trabalho de "trago seu amor de volta".
O cara era um ótimo empregado: não chegava atrasado, entregava tudo certinho antes do prazo com todos os relatórios prontinhos, mas nunca sorria, mesmo depois do aumento de setenta por cento que recebeu em seu salário. Seu Rogério achava isso estranho, era um cara bom de papo, torcia pro Vitória, sabia tudo sobre futebol e bolsa de valores, mas tinha uma coisa estranha nele: as pessoas não conseguiam ficar sozinhas com ele durante muito tempo. Não era bafo, nem que ele fosse antipático, ou não tivesse assunto, era algo... Uma áurea, ou coisa do tipo. Sei lá se meu lado exotérico está meio aflorado hoje, mas é isso.
O cara, tal de Suzano, um dia foi levado à depor como suspeito de um crime hediondo de Campo Grande - RJ. A vítima foi encontrada em pedaços dentro de sua casa, estraçalhada com uma faca nada amolada deixada no local. Quem via a cena podia sentir, talvez, o que a própria vítima sentiu. Essas horas o estômago embrulha. Nos antebraços, um em cada canto da cozinha, se via as marcas das mãos do homicida e a força com a qual ele domou a vítima. As peças de roupa da vítima estavam todas cortadas, jogadas por toda a casa, mas o que mais assustou foi a calcinha rosa posta na cabeça da vítima, fincada num cabo de vassoura na área de serviço. A cabeça foi a única parte que o assassino deixou intacta, fora os 6 cortes que ele fez nas sobrancelhas, 3 em cada uma delas, e os hematomas que denotavam que a morte aconteceu, segundo os legistas, a não mais que 5 horas atrás.
Suzano era o suspeito mais escancarado, pois a perícia encontrou seu semên na cama da morta, que tinha nome de Marrie. Trabalhavam na mesma empresa, ela era sua secretária. Há uns tempos vinham tendo um caso, mas nunca tinham ficado sozinhos os dois, porque o Estevão, colega de trabalho dos dois, lá do departamento de Marketing, tinha um lance com a Beatriz, colega de Marrie, aí faziam parzinho de casais. Marrie chegou a comentar com Beatriz e Estevão que nas duas únicas vezes que eles foram ao cinema sozinhos, ela se sentiu muito mal, enjoada, viu coisas estranhas, vultos, disse que quase desmaiou. Beatriz riu e disse que Suzano devia ser um negro muito bom mesmo para causar tudo isso. Estevão ficou irritado, mas não deu muita atenção, afinal guardava um pouco para as outras 3 colegas de trabalho com quais ele tinha casos e também para Cristina, sua esposa.
Alguns fãs de Dr. House poderiam dizer que talvez Suzano liberasse alguma substância, que induzisse as pessoas que ficam perto dele por muito tempo há algum tipo de esquizofrenia. Não era algo que se mostrava em pessoas específicas, qualquer um que ficasse sozinho com ele por um determinado tempo começava a sentir estas coisas esquisitas. Desde pequeno era isso. Suzano até se tornou um pouco introvertido por conta desse detalhe. Não ria pra qualquer um, negava alguns apertos de mãos, alguns o chamavam de presunçoso, mas ele não ligava. Esse negócio de ser introvertido o ajudou um pouco com as mulheres. A maioria delas gosta de gente quieta, misteriosa. O problema é que Suzano era misterioso até demais nesse caso. Ninguém sabia onde ele morava. Ele nunca aceitou uma carona e não tinha carro. E com o salário que ele ganhava poderia comprar 7 carros do ano. As pessoas o viam pegar o metrô; ele soltava na estação da Pavuna e depois disso ia andando para casa, então talvez morasse na Pavuna.
A polícia desmentiu essa história de Suzano morar na Pavuna, pois, se fora ele o assassino, ele levaria 2 horas para chegar na Pavuna saindo de Campo Grande, e o segurança do condomínio o viu sair às 4:30; sem levar em conta também que a morte foi, estimadamente, às 5:10. Mas preferiram dizer que ele não morava na Pavuna, que o segurança talvez não tivesse acertado o relógio no horário de verão, ou que o relatório dos legistas tinha alguma grande margem de erro do que dizer que ele não era o assassino. Tinha um quê de que queriam incriminá-lo a qualquer custo no ar. Mas deixemos as autoridades fazerem o seu papel.
Beatriz ficou chocada com o assassinato. Seu Rogério ficou tão preocupado com Bia que lhe deu 1 semana em casa, mas só deve ter feito isso por conta das leis trabalhistas, por que do jeito que ele era sovina... Seu Rogério morava sozinho, viúvo de dona Elizabeth que morreu depois do terceiro infarte consecutivo em apenas um dia. Elizabeth não tinha hipertensão, mas comia mais sal do que o que há no mar morto inteiro. Gabava-se de beber bastante água e ser mais saudável que Seu Rogério por isso, mas bateu as botas de um dia pro outro em seus curtos, ou longos para Seu Rogério, 38 anos. Rogério parecia dar graças a Deus em suas lágrimas falsas durante o velório. Suzano foi ao velório e ficou observando o Seu Rogério chorar, pensou logo: "Que cara falso esse"; Suzano via de longe uma lágrima falsa. Reconhecia assim facilmente, talvez, porque viu as que sua mãe derramava enquanto seu pai lhe agredia vorazmente. Por sofreguidão e angústia pela morte de dona Elizabeth, muito amiga de sua mãe, Suzano ficou também uma semana sem trabalhar.
Eles tinham ido ao cinema naquela semana de folga de Suzano, me refiro a Suzano e Marrie. Viram um filme de terror, desses que as mulheres passam o filme inteiro abraçadas com seus homens protetores. Marrie se queixou de estar se sentindo mal e Suzano a levou para casa; isso foi numa quarta-feira. Na sexta-feira foram de novo. Suzano decidiu que veriam um filme de comédia para evitar, pensando ele que o filme fosse a causa, que Marrie passasse mal de novo. Marrie acatou. Mas como todos os inteligentes sabemos, não adiantou muito. Marrie se sentiu mal novamente, com vertigens, delirou um pouco falando umas línguas estranhas... Coisa de louco, só quem viu pode falar. Deixou o copo de 500 ml de coca-cola cair no chão e tudo, imagina! Na saída do cinema encontraram uma amiga de infância de Marrie, conversaram um pouco e Marrie começou a se sentir melhor. Suzano a levou para casa e deu um trato daqueles. Esse negão arretado!
As pessoas da empresa comentavam muito sobre os modos de Suzano. Eram, como dizer... Impecáveis! Os homens o invejavam pela paciência que tinha em ser cavalheiro a todo tempo. As mulheres o aclamavam. Já tinha recebido centenas de milhares de bilhetinhos maliciosos das mulheres de toda a empresa, inclusive das mais bem casadas. Se colecionasse os bilhetes teria mais do que o número de páginas dos livros da biblioteca nacional. Aliás, Beatriz gostava muito de tirar suas folgas lá na biblioteca. Acabava-se de ler. Quase morria de tanto o fazer. Overdose de literatura... Se existisse, ela estaria muito perto. Suzano, por sua vez, ia vez ou outra até lá para pegar, ou entregar algum livro. Na quarta-feira da semana da folga de Bia, Suzano foi e encontrou-se por acaso com ela. Ficaram durante horas lendo sobre filosofia, astronomia e pautas das mais variadas, depois saíram para tomar um sorvete, Bia que convidou.
Pobre Bia, sujou seu vestido branquinho com sorvete de chocolate. Imagine o pesar. Suzano foi ajudar a pobre e nesse clima todo de sorvete escorrendo rolou um beijo. Mas um beijo daqueles, que até o sorveteiro babou. Derreteu tudo em baixo de Bia, que convidou Suzano à sua humilde residência. Agora ela estava realmente decidida a se sujar de chocolate! Em pensar que Suzano a considerava um pouco racista... Mas sempre foi assim né!? Para fornicação não há coisa melhor que um pouco de melanina.
Pobre Suzano, mais um assassinato! Penso que nem se Deus fosse advogado de Suzano ele conseguiria se livrar dessa. Bia foi a próxima vítima do assassino. Seu apartamento estava lavado em sangue. A cena se repetia em alguns detalhes: antebraços jogados um em cada canto da cozinha, com as mesmas marcas de mãos que apertaram com força; a cabeça intacta, com os mesmos 6 cortes nas sobrancelhas, o que diferenciava é que não tinha uma calcinha em cima, mas um pano de chão de banheiro, aqueles com desenhos de pés, e a cabeça estava em dentro do vaso do banheiro, entupido e cheio de fezes.
Pobre Suzano! Mas para sua sorte não haviam provas suficientes para incriminá-lo, a não ser seu sêmen na cama das duas vítimas. Não haviam digitais, roupas do assassino, ou qualquer coisa do tipo. Ele usava sempre uma faca desamolada e matava da mesma forma: lutava com a vítima; fazia um rasgo no abdômen (sem seguir qualquer regra, o rasgo era apenas para matar a vítima);  enquanto a vítima agonizava, ele ia cortando membro a membro do corpo; depois os despeçava e jogava pelos cômodos. O que se repetia nesse aspecto eram os antebraços na cozinha e a cabeça sempre algum objeto em cima e com os cortes nas sobrancelhas.
Haviam rumores na empresa, um ar meio sombrio rondava o lugar, as pessoas passavam longe da sala de Suzano, sua nova secretária se demitiu, mas o mais estranho eram os 2 porta-retratos que Seu Rogério viu na sala de Suzano, um com uma foto de Marrie e outro com uma foto de Bia. Suzano viu o tal olhando para eles e disse, um pouco nervoso me parece:
- Eu coloquei ai depois dos assassinatos. Sinto falta daquelas duas. Elas fazem muita falta para a empresa, eram umas das poucas pessoas em que eu confiava de verdade.
Seu Rogério creu na verossimilidade que a fala de Suzano transmitiu e completou:
- É, Suzano, aquelas duas vão fazer muita falta. Ainda mais agora nesse período de bang! da Bolsa de Tóquio. - o velho apontou para os gráficos na parede - Têm nos aparecido muitos projetos e Beatriz era uma das consultoras que mais rendia nessa empresa, trabalhava muito e sempre com uma sublime excelência.
- Marrie também nunca deixou a desejar como minha secretária. - disse Suzano olhando a foto da moça.
Depois da morte de Beatriz, Estevão e Suzano ficaram mais próximos, apesar do antagonismo dos fatos. O caso era que Estevão não cria que Suzano fosse o assassino, pensou que fosse outro tipo de pessoa, que ele sabia bem quem podia ser. Suzano descobriu um segredo que Estevão guardava muito bem: ele era o gigolô da empresa. As mulheres pagavam para sair com ele e às vezes bem caro, inclusive as mais bem casadas. Suzano entendeu logo o porquê de tantos bilhetinhos maliciosos vindos especialmente desse grupo de pessoas: a maioria das mulheres casadas que trabalham doze horas em empresas de economia não devem ter tempo para manter uma vida sexual instável e satisfatória com o parceiro, logo procuram a água da fonte mais perto. E pelo tanto de mulheres diferentes e magníficas, colegas de trabalho, ou não, com as quais Suzano já viu Estevão sair, ele devia ser um ótimo gigolô.
A amizade dos dois crescia paulatinamente. Estevão até chegou a convidar o "negão" - como o chamava - para entrar no negócio com ele. Pediam conselhos um para o outro: Estevão sobre como ser mais cordial com as mulheres, Suzano como fugir de tantos olhares de repugnação como se ele tivesse mesmo matado as meninas. É claro que nunca conversavam sozinhos os dois por muito tempo. Suzano contou sobre essas coisas estranhas que tinha desde pequeno e explicou que era melhor para o amigo que não conversassem por mais de 4 horas seguidas sozinhos. Não era nem pela presença, era pelo fato da conversa. Talvez Suzano realmente tivesse um bafo-de-onça, mas ai a história não teria tanta graça.
Suzano foi à farmácia, estava com um pouco de tosse, esses sintomas de falta de umidade no ar. Comprou um xarope e aproveitou para comprar preservativos. Talvez ele quase tivesse que pedir por encomenda, era quase um tamanho único, o tamanho que a farmácia só comprava uma caixa que durava quase uns 5 anos para vender tudo... Big Mac Ultra Mega Giga Power Grande. Grande Suzano. A caixa da farmácia bateu o código do xarope, mas na hora do preservativo arregalou aqueles olhões maliciosos. Quem sabe imaginou que poderia ser atropelada por um ônibus alguma vez na vida, quem sabe imaginou que poderia ter um filho com Síndrome de Down, quem sabe o que ela imaginou... Uma loirinha com cara de sapeca, de grande caráter, ótimas medidas, quadril esmerilhado, lábios aveludados e todo o mais que "gente grande" tem direito.
Na nota fiscal veio não só o preço dos produtos que comprou, mas também o telefone da loira, o endereço da casa e uma frase que dizia: "te espero às 20h, gigante". Coisa de louco esse Suzano. Por um momento passou em sua cabeça cobrar pelo serviço, afinal, tempo é dinheiro, como dizem os economistas e os sovinas, como Seu Rogério. Suzano contou o caso para Estevão:
- Imagina só, a mulher olha para o tamanho do preservativo que eu uso e já me faz uma oferta libertina dessas. Como pode? Esse Brasil tá todo corrompido mesmo.
Estevão riu-se e retrucou: - Até parece que você não gostou, não é, Seu Suzano! Larga disso e vá na casa da menina. Vá se distrair, dê um pouco de prazer a ela. Você é um "grande homem" e um "grande amigo", escute o que eu digo.
Os dois caíram na gargalhada. Suzano disse:
- Vou ver o que posso fazer por ela. Vou pensar no caso.
- Deixa eu voltar para minha sala. - disse Estevão saindo da sala de Suzano - Ah, mas não se esqueça. - Estevão lembrou-se de alguma coisa - só não a mate depois.
- Tudo bem, vou ver o que faço. - disse Suzano.
Os dois riram novamente.
Durante o resto do dia de trabalho, Suzano recebeu alguns bilhetinhos anônimos com ditos bem pesados até para ele, que era velho de guerra no mundo da sacanagem em anonimato. Coisas que nem devem ser ditas aqui neste relato. Mas o que mais o intrigou foi o último bilhete que recebeu bem na hora que iria terminar seu expediente, logo depois de uma conversa que teve com Seu Rogério sobre um dinheiro que precisaria a mais para um projeto que tinha em mente. O bilhete dizia: 
"Dou-lhe tudo o que você quiser.
Dou-lhe meu corpo, minha vida.
Dou-lhe dinheiro. Dou-lhe minha fé.
Dou-lhe meus lábios e uma lambida."
Suzano seguiu caminho para sua residência, o mistério. Tomou banho e ficou pensando se iria ou não a casa da loira da farmácia. Foi! Mais uma morta... Pensamos todos! Mas não, dessa vez ele assumiu a morte, mas foi um suicídio. Morte por prazer não é morte, como diria Noel Rosa, ou não diria. A tal loira da farmácia tomou 3 viagras, por que queria aguentar tudo aquilo que ela esperava. Mas infelizmente não aguentou nem mais de uma hora de amor com Suzano. Teve um infarte e bateu as botas, as que nem usava no momento. Mas morrer de prazer não é morte, como alguém diria. A polícia até tentou acusar Suzano pela morte da indivídua, mas não podiam. Talvez tivessem que acusar a natureza, a maioria das coisas é realmente culpa dela, menina peralta cheia de suas artimanhas; se seu nome fosse Beatriz, viria bem a calhar.

(Prosa) Ah, o silêncio,

por José Mauricio.


          Voltamos a ser a raça que nos incomodava. Animais. Ah, o silêncio. Lá fora, a chuva violenta o asfalto e, quanto mais chove, mais parece que nos somos de vidro. Um grito que ecoa nos tímpanos sensíveis da criança. Ah, o silêncio. À espera da chegada, os humanos sonolentos e fatigados conversam entre si e até consigo mesmo sobre o prazer. Mais da metade sente vontade de se masturbar. Não falam nem contam esses segredos, mas movimentos bruscos e animalescos, suas respirações ofegantes, suas gritarias e desvairos exprimem fácil a sua origem grotesca e rústica. Ah, o silêncio. Acho que só se deu mal mesmo porque levou um susto. "Ah, o tão sonhado silêncio nunca existiu", pensou frustrado. Agora a violência da chuva é toda sobre mim. Na rua só existem corpos imóveis, automóveis e meu corpo, que clama por salvação. Na dureza do chão, os gotejos dão-se com tanto ímpeto que chega que quicam. Como pode? A gelidez da água nem se comenta. Ah, o silêncio. A gente não espera o silêncio. A gente espera o barulho. Porque o silêncio é a falta de barulho. A gente anda muito desacreditado. E o silêncio não deve nem existir. Silêncio. Psiu. Quanto mais você fala, menos te ouço. Você calou-se tanto. Eu falei demais, o problema sempre foi comigo. Você esqueceu da nossa estória. Talvez só eu soubesse dela e insisti em chamar de nossa. Eu falo como se tivesse terminado, mas aqui nada acaba. Aqui nesse peito sou todo esperança. Aqui nesse peito sou todo silêncio. Ah, o silêncio.

(Crônica) A vida, pelos cracudos,

por José Mauricio.

Da vida e suas etapas.
Há três tipos de gente: os que imaginam o que acontece, os que não sabem o que acontecem e nós, os que fazem acontecer. A vida? A vida não é nada mais que uma pedra no caminho. E as pedras no caminho a gente fuma. Traga. Engole. Invade. Prova e aprova. Sabe o que esse Brasil seria sem a nossa presença? Um poço de impurezas. Já pensou que nós somos o ponto de equilíbrio dessa osmose social? O governo tira do povo, o povo tira do governo. E nós? Nós tiramos de quem? Somos a própria independência. Temos por pai Dom Pedro I e por mãe a lua. A rua é nossa casa e somos a causa das angústias da humanidade. Viciados em nosso próprio corpo, templo do espirictus sanctus, que o padre sempre nos prega. O almoço na igreja está entrando em decadência, essa é a grande e única verdade que me libertou de alguma coisa.
Vocês podem pensar que não, mas todos vocês são uma parte de nós. Somos todos o vício, a penúria, a solidão. Somos o lixo, o prolixo, o prelúdio das cavalarias mecanizadas de nossa poluição visual, que fazem questão de não reproduzir nos postais. Imputaram-nos a voltar de onde viemos, ao ventre de nossas mães, ao anus de nossa madre, ao seio de nossa amada, à pobreza, ao vácuo  da insolidariedade popular nos dias de hoje. Só queremos uma roupa para vestirmos, um jornal para nos cobrirmos, uma guimba para fumarmos, um sinal para atravessarmos. Passarelas não servem para nada. É coisa de quem vive bem, é coisa de quem almeja algo. Nós almejamos o dia, o dia após o outro dia não coabitará em nossos desejos.
A calma de vocês me irrita.


Da vida dos escritores.
Acham que são melhores que nós. Os mais humildes e verdadeiros reconhecem que são como nós: fumam seus papéis, torram seus fonemas e tragam os códigos gramaticais. Tragam como se só houvesse isso para tragar. Tragam como se só houvesse isso para fazer na vida. Vivem como se só houvesse tempo para tragar. E tragam como se só houvesse tempo para viver este tempo de tragar.
É o tempo de colher e de escolher a dedo nossas personalidades. Nós escolhemos a nossa. A verdade. A liberdade. A pureza. Engolimos a seco esses grãos de areia branca e fina, esse pedaço de gordura de touros... Somos o requinte do proletariado. Os hippies sem paz, pois paz sem voz é medo e nos já emudecemos há muito. Cortaram nossas gargantas enquanto garganteávamos por nossa alforria. Desfiaram as cordas vocais, já finas e bambas nas quais a vida nos meteu.
Os escritores e seus afãs... Ah!, são todos fãs da fidelidade aos deuses pagãos, as deusas pagãs, ao paganismo que nos entretêm. Vinho alegra. Orgia purifica. E vamos à luta! Salve Jorge, Salve o Lula, Salve o Brasil. Se estourar a bolsa, eles nos darão outra: a Bolsa Família. Uma família inteira de gente que digere os projéteis esdrúxulos que vendem por unidade.
Os escritores são nossos maiores fãs. São parte da família. Fumam a vida, vivem o fumo e esfumaçam a manhã que nunca chega. O céu é cinza. Cinza-crack.


Da vida dos pombos.
Reações e mais reações. Em cadeia. Na cadeia. Prederam os ratos e puseram asas, nasceram então os pombos. Fedem o perfume dos ônibus cheios com a mesma aparência de quem os pega. Todos são pombos e todos os pombos se drogam. Injetam, cheiram, inalam, bebem, ouvem, se matam. Todos os tipos de drogas e todos os tipos de consumos. Tipifiquemos então quem são os pombos:
1 - Imagine a morte de um anão que foi rejeitado pela comunhão e pela catequese da vanguarda;
2 - Tente visualizar o enterro do anão, do pequenino, do polegar...
Impossível!

Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram sobre enterro de anões. Nem dos 7, nem dos 70, nem dos milhões. Anão não morre. Anão vira... Pombos coabitam entre si, não os leve por eunucos ou dos celibatários. Eles coabitam e muito. Quase como os leões, ou os coelhos, ou os grilos, ou os vagalumes. Mas são estéreis, os coitados. Pombo não tem filhote. Pombo não nasce. E anão não morre. Anão vira pombo.
Povoam e esvoaçam e sobrevoam o nosso dia-a-dia. O pombo - gavião cracudo - é o anão que cansou de ser chacota, que cansou de pintar os rodapés e de não alcançar os cabeçalhos ou o sucrilho em cima do armário.
Somos, nós, pombos sem asa. Batemos nossos braços, batemos nossas palmas, planejamos e plantamos a esperança, ou a amargura, e nos deliciamos com o medo alheio que todos sentem por nós. Somos tão sujos quanto os empregados da COMLURB, esses que ninguém tem a ousadia de sentar ao lado no coletivo.
A sociedade nos expulsa, refutam nossas almas e nos chamam de porcos e nos tacam pelos precipícios. Todos os demônios habitam em nós e eles são muito mais do que apenas 7... São uma legião.

(Crônica) A ela, só usei,

por José Mauricio.

Encontrei-a jogada num canto da rua. Fiquei encabulado e penoso ao avistá-la tristonha, vazia e sem utilidade. Eu via sua busca incessante por olhares, onde apenas encontrava refutação. Os outros negavam sua existência e a cada segundo ela ficava mais velha, como se tivessem passado anos ou séculos. Seu físico já era de notável e expressiva carência de cuidados, ela sentia necessidade de se preencher com o que quer que fosse, mas ninguém a absolvia da solidão. Tive compaixão da pobre coitada, enquanto a observava tentei-me pôr em seu lugar e fiquei atônito com os sentimentos que emergiram de meu âmbito. Vi o que era o "sofrer" e me tornei um grande amigo da solidariedade e da prontidão, duas grandes pessoas, aliás. Levei-a para minha morada e lá chegando lhe mostrei as riquezas das quais ela não tinha conhecimento algum. Comecei a encucá-la com minhas ideias, probabilidades fajutas, objeções; vi sua gratidão quando se abriu e tentou acomodar e organizar minhas orações em sua mente, para que conseguisse mais espaço e pudesse aprender mais comigo. Difícil mesmo foi quando ela se viu lotada. Não vi outra saída a não ser retirar tralhas que já não serviam mais para ela e nem para mim. Criamos um relacionamento de armazenamento. O que eu precisava levar a algum lugar jogava dentro dela e a levava comigo. Aonde quer que eu fosse lá estava ela atrás de mim. Sempre de prontidão, como eu o fiz com ela. Seu ato de servidão me deixava embasbacado. Um ser tão imponente, tão sério, sereno e morno agindo de uma forma tão auxiliar e prestativa. Não conseguia deduzir seu estado anterior deste novo. Certo dia, caí numa forte depressão misturada com indignação e ignorância, tornei-me deveras arrogante. Não conseguia entender a diferença de um ser que era sozinho e vazio, e um ser que agora é parte de um conjunto e sempre cheio. Um ser sozinho pode ser aclamado por outros seres, um ser vazio pode ser cheio de coisas que o aclamem, mas um ser abarrotado, tudo nele se torna stress e as coisas viram meras tralhas, e um ser que sempre está em comunhão com muitas pessoas nunca pode ter um momento de melancolia e nostalgia só para ele, sempre que tem crises de tristeza alguém lhe vem perguntando: "O que há?". Realmente, concordo que é triste o ser só e vazio, mas é mais triste ainda ser sempre lotado e social. E o pior de tudo é que ela não tinha poder sobre si mesma, sempre era eu que a influenciava. E ela nunca se opunha contra minha opinião de armazenamento, nem nunca se quer questionava minhas escolhas. Nunca retirara nada que eu havia posto, nunca punha nada sobre o que eu já havia posto. Na verdade, ela só servia a mim para ser preenchida e esvaziada, mas logo em seguida preenchida. Só me servia cheia e quando estava vazia eu a enchia para que servisse a mim. Eu comecei a enlouquecer com minha tirania, um sentimento primário tão sublime e admirável, que era a compaixão, se tornou em severa escravidão e liberdade para a injustiça. Mesmo vindo a ter esses pensamentos contra meu ser ditador, eu seguia usando-a como fonte de tralhas e sustento de viagens. A ela dei o nome de Mochila e nós seguimos a vida. 

(Crônica) À cavalo

por José Mauricio.

Mais uma crônica, repleta da hegemonia dos clássicos:
Sherlock Casimiro e Zé Watson.

     - Sr. Casimiro, recebi este bilhete hoje de manhã de alguém que se diz arrependido por um assassinato. O tal não se identificou, mas nos ligaram à tarde para avisar de um corpo encontrado num rio. Achamos que é o mesmo caso, intuitivamente. Não sabemos quem é o morto. Não tem documentos e ninguém das proximidades reconhece. Mendigos, moradores, vendedores, ninguém. É um caso bem complicado, detetive.
     - Talvez seja, delegado. Talvez seja. Onde está o corpo? Precisamos vê-lo.
     - Vamos ao necrotério.


     Watson avaliou o corpo e, com propriedade, concluiu que o candango era um mendigo, a se dizer pela grande barba, cabelos imundos, roupas de trapos...
     - O que pode me dizer, Watson? – perguntou Sherlock.
     - Foi morto esta manhã com um tiro na cabeça, evidentemente.
     - É justo isso o que diz no bilhete – interrompeu o delegado.
     - Parece que estamos no caminho certo – concluiu Sherlock. – Mas a situação é um tanto quanto contraditória, amigos. O tiro na cabeça denota o homicídio proposital, talvez planejado. Entretanto, o bilhete enviado ao delegado demonstra o sincero arrependimento por parte do assassino. Pelo antagonismo das ideias que citei, concluo que este bilhete seja só uma artimanha de um jogo que o assassino quer criar.
     - É notável a intencionalidade do assassinato, dado que é um mendigo de uma região diferente de onde o encontramos morto, pois, como apurado, ninguém o conhecia nas redondezas nem ao menos os próprios mendigos.
     - Elementar, meu caro Zé. Elementar!


O telefone toca!
     - Sim?
     - “Detetive?”
     -
Sim. Quem deseja?
     - “Aqui é o delegado Irineu, detetive. Estou ligando para lhe avisar de outro bilhete que recebi do assassino.”
     -
A caligrafia bate com a do anterior?
     - “Sim, detetive. Também procuramos digitais, mas sem sucesso. Pelos garranchos bem trabalhados, pude averiguar que o assassino tem boa caligrafia, mas parece-me que ele escreveu os dois bilhetes com luvas. Eu mesmo fiz testes e vi que é bem complicado.”

     - Bela dedução, delegado. Pode ler o bilhete para mim, por favor?
     - “Diz: ’Achem-me, encontrem-me. Não suporto mais essa dor de arrepender-me, contudo não posso me entregar, pois o morto não aprovaria. Eu o matei quase por solicitação, mas ele não falava para confirmar-me a paz de espírito. E creio ainda, também, que tivesse salvação. Sou totalmente contra a eutanásia, mas foi a única salvação que vi no momento para livrar um amigo da dor.”
     - É como disse, Sherlock. O morto possuía um tumor na falange, este lhe deixou impossibilitado de falar. Não posso afirmar com muita propriedade há quanto tempo, mas nestes últimos dias ele deve ter sofrido muito, dado pela infecção que contraiu, como podemos ver. Deve ter comido algo contaminado, ou pegou uma gripe, ou coisa do tipo. A garganta infeccionou e agravou-lhe muito a dor – disse Watson.
     - O assassino é um médico que cuidou de um mendigo há pouco tempo. Mande seus homens investigar médicos deste perfil nos hospitais públicos e também médicos que moram perto de onde encontramos o corpo, delegado. - Às ordens, detetive.
    - Pesquisamos a cerca de médicos que moravam nos arredores de onde encontramos o corpo, como disse, e achamos um em especial. Ele disse que cuidou de um mendigo recentemente. Chegou ao hospital reclamando de muita dor, fizeram uma radiografia e perceberam um corpo estranho. Através de uma laringoscopia, puderam ver que ele tinha um tumor na falange - relatou o delegado Irineu.
    - A descrição bate. Pegamo-lo! - disse Zé Watson esfuziante, sorrindo ao vento e dando dois tapinhas no ombro de Sherlock.


Prenderam o tal doutor. Nome de Orféu. Na mitologia ensinava harpa. Agora não conseguiu tocar estas cordas. Não as vocais.
     - Vamos de metrô, Sherlock?
     - Sim, caro Zé.
Sentou um cara meio impaciente ao lado dos dois. Sherlock, com seu cachimbo em pleno fumo, avaliava o homenzinho trêmulo dos pés à cabeça.
     - A julgar por seu nervosismo, mãos trêmulas, palidez e sudorese, eu diria que o senhor cometeu um crime e está a caminho da delegacia para confessar.
     O homem congelou.
     - E então? - forçou-lhe Sherlock Casimiro a falar.
     - Sim, eu confesso. Mandei dos bilhetes para a delegacia, mas parece que o delegado e sua equipe não são lá tão bons. Assim como você me parece ser.
     - Então foi o senhor o criminoso que matou o mendigo canceroso? – Zé Watson perguntou de ímpeto, com um quê de raiva e indignação.
     - Não. Só sacrifiquei meu cavalo Lineu, mas acho que ele tinha salvação.

(Diálogo) Voar...,

por José Mauricio.

Criança suja: - Por quê?
Homem barbudo: - Por que o quê, menino?
Criança suja: - Porque sim!
Homem barbudo: - Você é louco?
Criança suja: - Não sei.
Homem barbudo: - Como não sabe?
Criança suja: - Os loucos sentem fome?
Homem barbudo: - Não necessariamente.
Criança suja: - Então sou um louco necessariamente.
Homem barbudo: - ...
Criança suja: - ...
Homem barbudo: - ...
Criança suja: - Me dá um trocado, tio?
Homem barbudo: - Sabia que você só queria isso. Não tenho dinheiro para lhe dar.
Criança suja: - Viu!? Você também é louco. Já se esqueceu do troco que acabou de receber? Eu vi você comprando essa garrafa d’água.
Homem barbudo: - ... Mas para que você quer dinheiro?
Criança suja: - Não sei.
Homem barbudo: - Você é realmente louco... Pede-me dinheiro e nem sabe para quê.
Criança suja: - Meus pais precisam do dinheiro para me alimentar. Assim eu deixo de ser louco, entendeu?!
Homem barbudo: - ... Entendi. Quanto você qu...
Criança suja: - Ali, ali... Você já voou em um avião daquele?
Homem barbudo: - Já voei sim. Você gosta de aviões?
Criança suja: - Não sei.
Homem barbudo: - ...
Criança suja: - Você sabe por que a lua cheia às vezes é abóbora?
Homem barbudo: - Sei sim. É por que quando a lua está mais baixa a luz tem que percorrer mais atmosfera e por essa atmosfera só passam os raios da cor laranja. Entendeu?!
Criança suja: - Meu irmão me disse que Deus pinta a lua de abóbora quando Ele está mais feliz. Quando Ele está entediado a deixa branca mesmo. E quando está triste ele chora, por isso que às vezes a lua não aparece.
Homem barbudo: - Isso também!
Criança suja: - Meu irmão é muito esperto, quando eu crescer, vou ser piloto de avião igual a ele.
Homem barbudo: - Seu irmão mora com você?
Criança suja: - Não, ele viajou para muito longe. Meu papai disse que ele está lá em cima no céu, voando e olhando para a gente.
Homem barbudo: - ...
Criança suja: - Você também tem irmão né, tio!? Ele mora com você?
Homem barbudo: - Não. Ele também está lá em cima voando e olhando para a gente.
Criança suja: - Talvez o seu e o meu irmão sejam amigos, né!? Como nós!
Homem barbudo: - É!
Criança suja: - Mas você vai me dar um trocado?
Homem barbudo: - Vou sim, tome.
Criança suja: - Muito obrigado, tio. Que Deus lhe pague.
Homem barbudo: - De nada...

*** O homem embarcou no ônibus que estava esperando. Ao virar a rua o ônibus se chocou com um caminhão... Ele agora está voando. Olhando lá de cima para a gente.

(Prosas) Portão e Prosa,

escritas por José Mauricio e vividas por Hyago Casimiro.


CHUVA DE VERÃO.


- Paixão, não. Você quer levar tudo para o amor.
- Não, não. Amor mesmo que não tem motivação; dá-se como a chuva de verão, a qual não se espera nem se tem notícia prévia.
- Chuva de verão não se espera? Eu sei que todo dia vai chover ao final da tarde.
- Mas fica ansioso? Esse saber te motiva? Isso aí que é o amor.


MENINA ZUMBI.

- Viu aquilo ali?
- O que?
- Aquilo!
- Aquilo ali? Aquele vulto lento?
- É. O que é aquele treco?
- Parece uma menina.
- Uma menina muito branca para estar viva.
- Uma menina zumbi não é.
- Pode ser.
- Não sou em quem vai perguntar a ela.
- Nem eu.
- E se não for uma menina zumbi, mas talvez a mulher da sua vida?
- Bom, se for a mulher da minha vida é bom que eu a deixe passar. Prefiro a mulher da minha vida bem viva!


PUTA PEDINDO PARA ENTRAR.

Toc! Toc!
- Quem é?
- A Carlinha! Sou eu!
- Carlinha? Desculpe não sei quem é.
- Está tarde, eu não tenho onde dormir, será que posso dormir aí?
- Mas eu não vou abrir o portão se eu não te reconhecer. Quem é você?
- A Carlinha dali da rua de baixo.
- Carlinha? Juro que não sei quem é... Me desculpe.
- Espera, não vá embora. Eu posso pagar para dormir aí?
- Por que então não procura um hotel, Carlinha?
- Não querem me aceitar. Só acompanhada, eles dizem.
Abre o portão.
- De acordo com as suas roupas, perdoe meu linguajar, mas... Você é uma puta?
- Sim. Esse é meu trabalho. E se quiser posso pagar com o corpo para dormir aí na sua casa.
- Eu pensei que se você entrasse eu nem te deixaria dormir com esse coxão todo.
- Então posso dormir aí contigo, gostoso?
- É claro que não. Tchau!
Bate o portão.


BÊBADO PEDINDO COMIDA.

- É, mas é como eu te disse, não é?! A gente nunca sabe...
Interrompido.
- Ei, moço. Você pode me dar um prato de comida?
- Você está com muita fome?
- Sim. Muita fome. Há três dias eu não como.
- Você vive na rua?
- Eu tenho casa, mas fico mais pela rua, porque eu sou um bêbado, um alcoólatra maldito.
- Dizem que não é bom beber de barriga vazia... Vou pegar comida para você, espera aí.


FUSCA CAINDO NA VALA.

- Ei, papai, olhe a pista. Se você ficar olhando todas as meninas que passarem a gente vai acabar batendo.
- Você precisa curtir mais a vida, meu filho.
- Não vou poder curtir nem a festa do Paulinho, se você não dirigir com cautela, pai.
- Calma, filhão. Tá tudo sobre... Meu Deus! Olha aquela loira ali do outro lado... Ei, você aí. Loirinha. Dizem que Deus não dá inteligência e formosura no mesmo corpo. E que formosura, ein, minha filha.
- OLHA A RUA, PAI!

* * *

- Vou lá na padaria agora, mãe. Na volta eu ponho o lixo para fora.
- Tudo bem.
- Ei, mãe. Já viu isso aqui fora na rua?
- O quê, filho?
- Um fusca dentro da vala e uma loira chorando. Devia ser namorada de um dos dois corpos que estão colocando no carro. Ainda bem que não consegui minha carteira ainda, poderia ser eu, não é mesmo?! Enfim, tomara que tenha pão quente na padaria, esse acidente me deu fome.
- Volta rápido para colocar o lixo, ein.


ENCHENTE.

- Chegou a ir para o hospital naquele dia?
- Não, não.
- Eu não pude te ajudar mesmo. Estava atrasado para ir a academia.
- Tudo bem, não era sério. Era só um corte mesmo da corrente da bicicleta.
- É tão comum cair de bicicleta, não é?! Acho que se não caíssemos e nos machucássemos assim, com tanta naturalidade, não seríamos humanos... Talvez nós mesmos pensássemos que somos E.Ts..
- Com certeza.
- E por que me trata com tanta frieza?
- Preciso ir a alguma academia e lá vejo se acho alguma preocupação para contigo.
- Valeu, então. Eu já pedi desculpa, você não aceita. Então, tudo bem... Tchau!
- Valeu.

* * *

- Por favor, me ajude. Estou perdendo tudo. Preciso de alguém para me ajudar a salvar pelo menos a geladeira e o sofá. Seu pai está em casa para me ajudar? Ou você mesmo... Me ajude, por favor.
- Enchentes são tão ruins, não é?! Morar em lugares altos às vezes ajuda. Que sorte a minha, não?!
- POR FAVOR, AJUDE-ME!
- Estou atrasada para a academia. Vê como eu tenho ficado cada dia mais gostosa e cada dia dando menos bola para você? Abraços, amigo.


VISITA ALIENÍGENA.

- Está vendo lá no céu?
- O que? As luzes? Sim. Mas estamos bêbados.
- Aquilo está vindo para cá. É um VINI.
- VINI? Você quis dizer OVINI?
- Isso - ihc! - isso.
- Não sei. Não parece. Parece um avião. Sempre é um avião afinal.
- Dessa vez acho que não. E se for um VINI?
- Se for, a gente aperta a mão deles e pergunta se eles têm mais cachaça.


GRUPO DE TAMANDUÁS.

- Ali, amor. Viu?
- Não. Não tô vendo nada. Volta pra cama, amor. Tô cheia de fogo e você aí vendo bichos estranhos pela janela. Te falei para não fumar aquele bagulho todo.
- Não, amor. Eu não fumei. Deixei guardado pro seu pai. Ele me pediu ontem.
- Ele veio aqui ontem?
- Sim, veio.
- ...
- Ali, Michele! Ali! Tá vendo? Que porra de bicho é aquele?
- Tô vendo! Tô vendo!
- Que porra é aquela?
- Parecem tamanduás.
- Que porra que tamanduá tá fazendo aqui nessa maldita Seropédica?
- Não sei.
- ...
- Parece que é a família toda. O pai, a mãe e o filhinho.
- Aquelas porra estão de mãos dadas? Não é possível!
- Estão sim.
- Tamanduá tem mão? Não é quadrúpede?
- Sim.
- Então que porra de bicho é aquele, Michele?

domingo, 19 de maio de 2013

(Poesia) Vagabunda,


por Zé Mauro.

Vagávamos pelas florestas
Em busca das festas
Em busca de nós
E os marinheiros desatavam
E de beber se intrigavam
Se a vida realmente
é um pedaço de mar

Vaguei por entre as dunas
Os riachos de Inhaúma
Os rios de tua voz
E os marinheiros esqueceram
De se matar, se perderam
"E se fosse a vida da gente
um pouco mais que amar?"

Não há nada que possamos fazer.
Ela já estava à beira da morte
muito antes de chegar aqui.

Você sabe que ela sempre foi disso.
Zanzar pelas ruas, vagar pelos montes,
e vaga ela, vaga pernas, vaga bunda...

(Poesia) Uma pergunta,


por César.

vale a pena
ser de gelo
derreter
como caramelo
e morrer
com esse apelo
e vale a pena
ser tão belo
ser de outro
ser relance
ser assim
por um instante
pelo o fim
deixe-me solto
e tudo isso
são apenas questões
que me assolam
o compromisso
as desrazões
e o seu ser omisso

(Poesia) Um poema para Deus,


por César.

Achei que seria interessante declamar o quanto te amo
O quanto me esqueço, o quanto mais te lembro
Relatar todo esse jeito de ser seu membro
Ser o seu inferior que te sustenta como um gênio a um amo

Resgate-me dessa vida extraterrestre
E ponha-me em teu mundo, mas que seja agora
Poupe-me dessa vida de ampolas, de mágoas
E injete-me adoçante, sorvete kibon, chicabom ou chiclete

Um pouco da tua sinestesia
Em sentir os dedos correrem o corpo
Em matar quem decerto já está morto
Em roubar o ar de quem tem asma e nem respira

Agora me despeço,
Tranco a minha vida dentro de mim
Para que sejas de minhas flores um jardim
Que me guarde e me sirva de unidade e progresso.

(Poesia) Seu aonde,


por José Mauricio.

Deus-no dinheiro.
Deus-no a vida.
Do outro.

Deus-no a morte.
Deus-no a riqueza.
Só nossa.

Deus-no tudo.
Deus-no o vácuo.
O buraco negro.

Deus-no o acaso.
Deus-no a esperança.
A sociedade.

Deus-no a sofreguidão.
Deus-no a fome.
A desigualdade.

Deus-no o nosso.
Deus-no o deles.
O de todos.

Deus-no a força.
Deus-no a fé.
A febre.

Deus-no a gripe.
Deus-no a epidemia.
Os gafanhotos.

Deus-no as pragas.
Deus-no o Egito.
A esfinge.

Deus-no um enigma.
Deus-no uma questão.
Nossa própria existência

Deus-no o pensar.
Deus-no o questionar.
Sua insólita certeza.

(Poesia) O vento!,

por José Mauricio.

Posso ouvi-lo passar
ver a onda
e o estrago
a vida é curta
e nao vê
pensei
que quando acabasse

Conselho de amigo: - Ela te faz mal, larga dela, ou conquiste-a, namore uns 5 anos, aproveite o máximo e depois jogue-a fora, pois ainda assim não valerá a pena.

acordaria no tempo
e pararia
por ele
por ela
um século
um mês
três vidas em marte
um passo
pra mim
pra dentro
pro recuo
recuarei
por que será?
pensarei
nisso tudo
como pode
você sonha
comigo
com o impossível de saber
nao digo que penso
e penso em dizer

Conselho de amigo: - Acho que ela te tortura.

isso eu vi
o vento leva
não sei mais
nunca soube
é como sonhar sabe
e o esforço pra lembrar
é so pra esquecer
tudo
ela
dela
de nós
isso porque diz mais
se a gente nunca soube
rir um do outro
então choremos
e talvez
sobre a gente
dure
perdure
vem renascido o amor

-

Poesia de atualizacão

Refeita, de forma, reformada
Desfeita a receita, remasterizada
E eu tentei te controlar
Tentei te ramificar

Não deu em nada
E eu te fiz acreditar
Mas eu sequer subi a escada
O que eu fiz, foi só amar

Mas isso é coisa de outro mundo
Coisa de gente antiga
De tralha, de quarto imundo
Coisa de gente amiga

Eu sou assim, não sei
Escrever, parafraseio
Se hoje diz que vens me ver, serei
Alegre desde ontem, no  anseio.

-

01:25
ventos e lágrimas
um século
sete vidas
as vidas detrás
são partes de nós
do nosso não dito
do nosso como será
o vento vai dizer
lento o que virá
e se chover demais
a gente saberá
claro de um trovão
se alguém depois sorrir
em vão
em paz
só te encontrar
e o que falta...
te encontrar no vento

(Poesia) Ex,

por José Mauricio.

Ex-gay.
Ex-pastor.
Ex-gente.
Ex-funcionário do Banco do Brasil.
Ex-funcionário da Petrobrás.
No fundo, isso tudo é impossível.
Odeio musicais.
Ex-tudo.
Ex-o que nunca fomos.
Ex-ex.
Ex-namorado do mesmo colégio.
Mais improvável que um meteoro em Sodoma e Gomoha.
Ex-tupro.
Isso é bem provável.
A trupe não para.
Eles matam.
E é caro.
Seu sangue vale o nosso.
Sua vida vale a nossa.
Vampiros.

(Poesia) Fox branco. Eu Era Um Lobisomem Juvenil,

por Zé Mauro.

Passou na TV, direi-te ó Mulato.
Vistes o que ocorreu neste céu azul claro?
Vi não, sinhô, o que se deu no local?
Foi mais um que morreu ou outro avanço de sinal?
Nem um, nem outro, cabra, foi diferente.
Foi um outro cabra doido, que agora deu pra comer gente.

Cada dia é uma novidade, uma loucura outra.
Mas não me assustam os canibais que vagam à solta.
O que te assusta então, pobre homem?
Te assustaria saber que o canibal tem teu nome?
Mas como eu? Não pudera jamais ser desse jeito.
Não como gente e disso sempre tive preconceito.

Talvez seja a lua, tua inimiga da eternidade.
Ou talvez seja tua mentira que está dizendo que dizes a verdade.
Eu larguei desta vida de lunático assaltado.
Converti-me ao judaísmo e hoje sou circuncidado.
Vende teu fox branco e essa angústia que te consome.
Tu estupras os filhos da pátria mãe, porque tu és O Lobisomem.

(Poesia) Aqui jazz a preocupação,

por J. Machintosh.

Essa alegria que combina com nossa dentição.
Essa experiência de juntar cadências...
As cadências de nossos corações.
E à decadência está o mundo lá fora.
Todos manequins da esperança
Vestidos com vestes sacerdotais
Extremamente específicas
Medidas a dedo, polegada
Marionetes dessa vida de diachos
E os riachos que nos molham
O rosto reluz o amanhã
Que há nos olhos da menina-moça
Que dança o samba
Que bambeia a bamba
Que incendeia a chama
Que ofusca o meu brilho
Ah!,...

O mundo não importa para nós.

Dance o bebop, baby, e ponha-nos numa estrela cadente qualquer.